Movimentos sociais, entidades, intelectuais e profissionais da área de Direitos Humanos estão reunidos para denunciar a criminalização da pobreza e os retratos da precariedade e do descontrole do serviço de segurança pública e do sistema de justiça. A partir dos casos de Diego Andrade da Silva e Ivan Santos Trindade, presos por crimes que não cometeram, uma carta pública apresentada a seguir denuncia e repudia I) a precariedade das politicas de segurança pública, II) o descontrole das policias por parte do Ministério Público III) o racismos estrutural do Poder Judiciário que condena negros e pobres distanciando-se dos ideais de justiça social. Leia a carta:

São Paulo, 17 de agosto de 2022

Não é de hoje que aqueles que ocupam posições de poder nas instituições de Segurança Pública e do Sistema de Justiça promovem violações de direitos contra o trabalhador. Neste contexto, vemos mais dois episódios de erros na prestação de serviços públicos que geram a prisão de inocentes: os casos de Diego Andrade da Silva e Ivan Santos Trindade.

Diego Andrade da Silva e Ivan Santos Trindade são duas vítimas da precariedade e irresponsabilidade daqueles que atuam na Polícia Civil, no Ministério Público e no Poder Judiciário. Ambos foram acusados de roubo após terem suas fotos retiradas das redes sociais e apresentadas para as vítimas como os criminosos que lhe causaram mal. A atuação policial foi no sentido de produzir provas que incriminassem Diego e Ivan.

Diego, também conhecido como MC Di, foi acusado de um roubo ocorrido ao meio dia de 09 de janeiro de 2017,na Rua Major Diogo, República, região central de São Paulo onde há inúmeras câmeras nas ruas e lojas, que poderiam ser utilizadas para comprovar que ele não estava no local; na hora do crime, MC Di estava em sua casa, no Jd São Savério, fundão do Ipiranga, mas a atuação dos agentes policiais do 36º DP Vila Mariana contra Diego, os policiais sequer tentaram obter filmagens do local do crime, marcado por muitas câmeras. Também não buscaram outros meios de provas possíveis.

Já Ivan é acusado de roubo em uma agência bancária ocorrido na manhã de 26 de janeiro e 07 de fevereiro de 2022, na Avenida Atlântica, Interlagos, embora na mesma hora estivesse na UBS onde trabalha. Também neste caso, agentes policiais do 102º DP Socorro não solicitaram imagens das câmeras de segurança para averiguação. Além disso, obtiveram uma suposta “informação privilegiada” para chegar ao acusado, sem informar a fonte, inclusive sem dar o direito do Ivan prestar esclarecimentos.

Nos dois casos, a polícia somente pesquisou nas redes sociais, incriminou e os colocou sozinhos para o reconhecimento, sem qualquer direito de defesa ou apresentação de outras provas. De acordo com a recente decisão do STJ, interpretando o artigo 226 do Código de processo Penal, para o reconhecimento pessoal é necessário apresentar outras pessoas parecidas com o suspeito ao lado dele, algo que não aconteceu. Com isso, os agentes policiais desrespeitaram as regras processuais para o reconhecimento fotográfico, induzindo as vítimas, que buscam um culpado para seu prejuízo. 

A promotoria de justiça, que custa aproximadamente R$20 mil por mês/ cada promotor, não cumpriu com o seu dever de realizar o controle externo das polícias, mantendo-se na comodidade de seus gabinetes para carimbar praticamente tudo que a autoridade policial enviar, sem questionamentos ou complementos para o conjunto probatório firmado em um recolhimento ilegal dos acusados.

Por sua vez, os julgadores também demonstraram seu descaso contra os trabalhadores, validando a montagem policial carimbada pela promotoria.

O descontrole das forças policiais precisa acabar. Os agentes da segurança pública precisam comprometer-se com os direitos dos cidadãos e realizar um trabalho técnico responsável. O Ministério Público precisa justificar sua existência e atuar na limitação do poder, evitando abusos e precariedades na atuação policial. O Poder Judiciário precisa ser mais justo.

Diego e Ivan estão presos por crimes que não cometeram. Em seu nome exigimos justiça e liberdade. Hoje foram eles e, se não houver reparação das injustiças frequentemente realizadas, amanhã pode ser qualquer um(a) de nós.

Contra o sistema racista que violenta e aprisiona trabalhadores elevamos nossas ações e nossas vozes e pedimos a todos e todas que apoiem a liberdade de Diego e Ivan, e manifestem sua indignação contra o racismo e o descontrole da atividade policial, ampliados pela atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário nos processos de criminalização da pobreza.

Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos
Rede de Proteção e Resistência Contra o Genocídio
Coletivo Perifatividade
Associação Amparar
Central dos Movimentos Populares
Coletiva Periferia Segue Sangrando
Heide K. D. Trindade (esposa de Ivan Trindade)
Sônia Silva (mãe do Mc Di)
Pastora Graziela Firmino da Igreja Internacional da Graça
Paulo Rams – Coletivo Perifatividade e Projeto Garoto Cidadão Unidade Heliópolis, da Fundação CSN
Benedito Roberto Barbosa
Ewerton Carvalho – Educafro
Glauco Batista de Almeida Hengstmann
Defensor Público Diego Rezende – DIPO
Vereador Eduardo Suplicy (São Paulo)
CEDECA Sapopemba
Paulo Sérgio Pinheiro, professor universitário

Assine você também:

Compartilhe: